Na feira da Zona Oeste de São Paulo, a feirante Rose Tragl, de 47 anos, enfrenta um dilema que reflete a realidade de muitos comerciantes. Apesar dos constantes aumentos no preço da carne por parte dos fornecedores, ela opta por reduzir sua margem de lucro para não perder clientes.
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Rose relata que, embora o preço justo para o filé de costela fosse R$ 79,90 por quilo, ela mantém o valor em R$ 69,90 para não afastar a freguesia. “Nosso lucro fica menor, mas, ao menos, mantemos a clientela”, explica.
De acordo com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15), divulgado pelo IBGE, o preço da carne subiu 7,54% entre 12 de outubro e 12 de novembro. No acumulado dos últimos 12 meses, a inflação chegou a 4,77%, pressionada pelo aumento nos alimentos e nas tarifas de energia elétrica.
O Peso da Carne na Cesta Básica
A alta da carne tem impacto direto no custo da cesta básica, que contém entre 4,5 kg e 6,6 kg de carne, dependendo da região do país. Como resultado, o aumento no preço desse item essencial puxa a inflação para cima. André Braz, economista do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV), aponta a carne como “a grande vilã” do aumento de preços em outubro.
Além da carne, outros alimentos também registraram aumentos significativos:
- Laranja-lima: +25%
- Óleo de soja: +8,38%
- Tomate: +8,15%
- Café: +2,79%
- Leite: +0,60%
Por que os Alimentos Estão Mais Caros?
Economistas identificam três fatores principais para o aumento no preço dos alimentos:
- Clima: Secas, incêndios e condições climáticas adversas reduziram pastagens e afetaram a produção de insumos, como soja, usados na pecuária.
- Economia aquecida: O aumento do poder de compra interno gerou maior consumo de carne no Brasil, enquanto a exportação também cresceu.
- Valorização do dólar: Tornou a carne brasileira mais competitiva no mercado externo, impulsionando um crescimento de 30% nas exportações entre janeiro e outubro de 2024.
Thiago Bernardino de Carvalho, do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea/USP), explica que 75% da produção de carne brasileira é destinada ao mercado interno, mas o aumento da demanda externa pressiona os preços localmente.
Impacto na População de Baixa Renda
A inflação afeta de maneira desigual diferentes faixas de renda. Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea):
- Famílias com renda de até R$ 2.105,99 tiveram inflação de 4,99% em outubro.
- Já famílias com renda superior a R$ 21.059,92 registraram inflação de 4,44%.
As famílias de baixa renda, que destinam a maior parte do orçamento a alimentos e tarifas básicas, sofrem mais com esses aumentos. Enquanto isso, para famílias de renda mais alta, os gastos com serviços, como educação e lazer, têm maior peso no orçamento.
Projeções para os Preços em 2025
Especialistas acreditam que os preços da carne continuarão altos pelo menos até o final de 2024, devido à demanda sazonal das festas de fim de ano. André Braz destaca que janeiro pode trazer uma desaceleração nos preços devido à “ressaca” do consumo, mas alerta que os valores permanecerão elevados a longo prazo por conta de fatores climáticos persistentes.
A última pesquisa Focus do Banco Central projeta uma inflação de 4,64% para o final de 2024, acima da meta de 3%, com margem de 1,5% para cima ou para baixo.
Repercussões Políticas para o Governo Lula
Do ponto de vista político, o aumento dos preços dos alimentos coloca desafios para o governo Lula. A promessa de “churrasco de picanha e cerveja”, feita durante a campanha, parece distante para a maioria dos brasileiros. Apesar de a picanha ter subido menos que outros cortes (3,6%), o acém (10%) e o patinho (8,6%) registraram altas mais expressivas.
Com o aumento da inflação, a popularidade de Lula pode ser impactada. Dados do Datafolha mostram que, em outubro, 36% da população considerava o governo bom ou ótimo, enquanto 32% o classificavam como ruim ou péssimo. Especialistas acreditam que um ajuste fiscal necessário para conter gastos pode agravar o cenário político.
Conclusão
A alta no preço da carne e de outros alimentos reflete desafios complexos, envolvendo clima, economia global e política interna. Enquanto os brasileiros enfrentam dificuldades para equilibrar o orçamento, o governo Lula precisará lidar com o impacto da inflação em sua gestão, buscando medidas para aliviar o peso no bolso da população e preservar sua base de apoio político.
Veja a matéria original em: BBC Brasil